O SIGILO DO PRONTUÁRIO MÉDICO E O DIREITO/DEVER DE INFORMAÇÃO EM TEMPOS DE PANDEMIA: UMA ABORDAGEM DIALÉTICA SOBRE O PODER DE REQUISIÇÃO DAS AUTORIDADES PÚBLICAS À LUZ DA TEORIA PRINCIPIOLÓGICA DE ROBERT ALEXY

Palavras-chave: Intimidade. Sigilo Médico. Dever de Informação. Poder de Requisição. COVID-19.

Resumo

Este artigo debate a relação entre o sigilo do prontuário médico, direito à intimidade, e o dever/direito de informação em tempos de pandemia, sob a perspectiva do poder de requisição de autoridades públicas, utilizando-se do sopesamento entre os princípios presente na Teoria da Colisão de Alexy, cujo afastamento se daria por autorização do paciente, dever legal ou por justa causa, conceito aberto a trazer dúvida se tais requisições, inclusive aquelas não precedidas de prévia jurisdição, teriam ou não a prerrogativa de acesso a informações em prontuários médicos. Trata-se de contribuição teórica, de recorte multidisciplinar, sob aplicação do método dialético. Por resultado, observou-se que há urgência e prevalência do dever de informação frente ao direito individual da intimidade, pois o sigilo médico não se sobrepõe à vida e à saúde, tendo em conta a realidade da COVID-19 e de informações ora requisitadas ao seu estudo e combate. Fundamenta-se a justa causa em verdadeiro estado de necessidade, não havendo se falar em reserva judicial. Sua abrangência se limitaria, entretanto, ao dever de custódia da autoridade requisitante: a confidencialidade quanto ao titular das informações.

Biografia do Autor

Aloisio Alencar Bolwerk, Universidade Federal do Tocantins (UFT)

Doutor em Direito Privado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Professor Adjunto de Direito da Universidade Federal do Tocantins (UFT). Professor Permanente do Programa de Mestrado Interdisciplinar em Prestação Jurisdicional e Direitos Humanos UFT/ESMAT. Líder do Grupo de Pesquisa em Direitos Humanos e Prestação Jurisdicional registrado no CNPQ. Advogado. 

Josean Pereira de Sousa, Universidade Federal do Tocantins (UFT)

Mestre em Prestação Jurisdicional e Direitos Humanos pela Escola Superior da Magistratura Tocantinense. Mestre em Gestão de Políticas Públicas pela Universidade Federal do Tocantins.  Bacharel em Direito pela Faculdade Católica Dom Orione.  Chefe do Setor Jurídico do Hospital de Doenças Tropicais da Universidade Federal do Tocantins / Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares. Advogado. 

Laís de Carvalho Lima, Universidade Federal do Tocantins (UFT)

Mestre em Prestação Jurisdicional em Direitos Humanos pela Universidade Federal do Tocantins - UFT e Escola da Magistratura Tocantinense – ESMAT. Analista do Tribunal Regional Federal da 1º Região (SJTO). 

Referências

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Publicado
2021-11-10