O SIGILO DO PRONTUÁRIO MÉDICO E O DIREITO/DEVER DE INFORMAÇÃO EM TEMPOS DE PANDEMIA: UMA ABORDAGEM DIALÉTICA SOBRE O PODER DE REQUISIÇÃO DAS AUTORIDADES PÚBLICAS À LUZ DA TEORIA PRINCIPIOLÓGICA DE ROBERT ALEXY
Resumen
Este artigo debate a relação entre o sigilo do prontuário médico, direito à intimidade, e o dever/direito de informação em tempos de pandemia, sob a perspectiva do poder de requisição de autoridades públicas, utilizando-se do sopesamento entre os princípios presente na Teoria da Colisão de Alexy, cujo afastamento se daria por autorização do paciente, dever legal ou por justa causa, conceito aberto a trazer dúvida se tais requisições, inclusive aquelas não precedidas de prévia jurisdição, teriam ou não a prerrogativa de acesso a informações em prontuários médicos. Trata-se de contribuição teórica, de recorte multidisciplinar, sob aplicação do método dialético. Por resultado, observou-se que há urgência e prevalência do dever de informação frente ao direito individual da intimidade, pois o sigilo médico não se sobrepõe à vida e à saúde, tendo em conta a realidade da COVID-19 e de informações ora requisitadas ao seu estudo e combate. Fundamenta-se a justa causa em verdadeiro estado de necessidade, não havendo se falar em reserva judicial. Sua abrangência se limitaria, entretanto, ao dever de custódia da autoridade requisitante: a confidencialidade quanto ao titular das informações.
Citas
ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2012.
ARAGÃO, S. M. Abortamento criminoso, prova penal e sigilo médico: uma análise transdisciplinar. Cadernos Ibero-Americanos de Direito Sanitário, Brasília, v.9, p. 182-207, abr.-jun. 2020.
BARROS, M. A. Sigilo Profissional. Reflexos da violação no âmbito das provas ilícitas. Justitia, São Paulo, n.58, p. 17-32, jul.-set. 1996.
BRASIL. D. R. COSTA, R. C. T. C. O direito à informação decorrente da pandemia de COVID-19 como um direito humano fundamental de realização imediata. In: COVID-19:Ambiente e Tecnologia. Itajaí: Ed. da Univali, 2020.
BRASIL. Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020. Dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/lei/l13979.htm. Acesso em: 19 mai de 2021.
BRASIL. Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011. Regula o acesso a informações previsto no inciso XXXIII do art. 5º , no inciso II do § 3º do art. 37 e no § 2º do art. 216 da Constituição Federal; altera a Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990; revoga a Lei nº 11.111, de 5 de maio de 2005, e dispositivos da Lei nº 8.159, de 8 de janeiro de 1991; e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12527.htm. Acesso em: 20 mai de 2021.
BRASIL. Lei nº 6.259, de 30 de outubro de 1975. Dispõe sobre a organização das ações de Vigilância Epidemiológica, sobre o Programa Nacional de Imunizações, estabelece normas relativas à notificação compulsória de doenças, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6259.htm. Acesso em: 22 maio de 2021.
BRASIL. Medida Provisória nº 928, de 23 de março de 2020. Dispõe sobre a revelação de conteúdo do prontuário ou ficha médica. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/mpv/mpv928.htm. Acesso em: 19 mai de 2021.
BRASIL. Decreto nº 10.212, de 30 de janeiro de 2020. Promulga o texto revisado do Regulamento Sanitário Internacional, acordado na 58ª Assembleia Geral da Organização Mundial de Saúde, em 23 de maio de 2005. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/decreto/D10212.htm. Acesso em: 19 mai de 2021.
BRASIL. Decreto nº 592, de 6 de julho de 1992. Atos Internacionais. Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos. Promulgação. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0592.htm. Acesso em: 20 mai de 2021.
BRASIL. Projeto de Emenda à Constituição nº 17, de 3 de julho de 2019. Altera a Constituição Federal para incluir a proteção de dados pessoais entre os direitos e garantias fundamentais e para fixar a competência privativa da União para legislar sobre proteção e tratamento de dados pessoais. Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1773684&filename=PEC+17/2019. Acesso em: 20 maio de 2021.
BRASIL. CFM. CONJUR. Despacho nº 184, de 7 de abril de 2020. Pessoas privadas de liberdade. Prontuário de saúde. Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/despachos/BR/2020/184. Acesso em: 18 mai. 2021.
BRASIL. CFM. Resolução nº 1.931, de 17 de setembro de 2009. Código de Ética Médica. Disponível em: https://portal.cfm.org.br/images/stories/biblioteca/codigo%20de%20etica%20medica.pdf. Acesso em: 18 mai. 2021.
BRASIL. CFM. Resolução nº 1.605, de 15 de setembro de 2000. Dispõe sobre a revelação de conteúdo do prontuário ou ficha médica. Disponível em: https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=96997. Acesso em: 18 mai. 2021.
BRASIL. Ministério da Saúde. Gabinete do Ministro. Portaria nº 188, de 3 de fevereiro de 2020. Declara Emergência em Saúde Pública de importância Nacional (ESPIN) em decorrência da Infecção Humana pelo COVID-19 (2019-nCoV). Diário Oficial da União, Brasília, DF, 4 fev. 2020. p. 1.
BRASIL. Ministério da Saúde. Gabinete do Ministro. Portaria nº 454, de 20 de março de 2020. Declara, em todo o território nacional, o estado de transmissão comunitária do coronavírus (COVID-19). Diário Oficial da União, Brasília, DF, 20 mar. 2020. p. 1.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 91218-5 SP. Segredo profissional. A obrigatoriedade do sigilo profissional do medico não tem caráter absoluto. Recorrido: Juiz de Direito da Vara Auxiliar do Segundo Tribunal do Juri de São Paulo. Relator: Min. Djaci Falcão, 16 de abril de 1982. Disponivel em: https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/912714/recurso-extraordinario-re-91218-sp. Acesso em: 18 mai. 2021.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 159527 RJ. Sigilo medico. Ética médica. Prontuário. Clinica. Seguradora. Viola a ética médica a entrega de prontuário de paciente internadoa companhia seguradora responsável pelo reembolso das despesas.recurso conhecido e provido. Recorrido: Clínica Médica Cirurgica Botafogo S/A Hospital Samaritano. Relator: Min. Ruy Rosado de Aguiar, 29 de junho de 1998. Disponível em: https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/19853876/recurso-especial-resp-159527-rj-1997-0091690-1?ref=juris-tabs. Acesso em: 18 mai. 2021.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus 584494 SP. Impetrado: Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Relator: Min. Ribeiro Dantas, 20 de agosto de 2020. Disponível em: https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/919895868/habeas-corpus-hc-584494-sp-2020-0124282-2. Acesso em: 18 mai. 2021.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental 672. Trata-se de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental proposta pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil em face de atos omissivos e comissivos do Poder Executivo federal, praticados no contexto da crise de saúde pública decorrente da pandemia do COVID-19 (Coronavírus). Intdo: Presidente da República e Ministro do Estado da Economia. Relator: Min. Alexandre de Moraes. Disponivel em: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADPF672liminar.pdf. Acesso em: 18 mai. 2021.
CARVALHO FILHO, J. S. Manual de Direito Administrativo. 31ª ed. São Paulo: Atlas, 2017.
CASTRO, A.P. Abortamento criminoso, prova penal e sigilo médico: uma análise transdisciplinar. Revista da Escola Paulista da Magistratura, p. 77-90, jul-dez. 2011.
DRUMOND, J.G.F.; DRUMOND, L. História clínica: aspectos ético-legais e jurisprudenciais do sigilo médico no Brasil. Revista Sideme, p. 1-8, jan.-mar. 2010.
FERREIRA, R.G. at al. Prontuário Médico: uma revisão bibliográfica. Bioética Cremego, Goiânia, v. 1, p. 2-8, 2019.
MARQUES, R.F.R. Requisição de prontuário ou ficha clínica no Brasil (Justiça, Ministério Público e Polícia) x Sigilo Médico. Cadernos Ibero-Americanos de Direito Sanitário, Brasília, v. 5 supl., p. 129-142, Dez. 2016.
MARTINS, Flávio. Curso de Direito Constitucional. São Paulo, Saraiva Jur, 2020.
MENDES, G.; BRANCO, P.G.G. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2017.
NORONHA, E. M. Direito Penal. v. 2. São Paulo: CETESC, 1981.
RÁO, Vicente. O direito e a vida dos direitos. v. 2. São Paulo: Max Limonad, 1952.
ROBORTELLA, L. C. A.; PERES, A. G.. Interpretação Jurídica em tempos de pandemia. In: O direito do trabalho na crise da COVID-19. Salvador: Juspodivm, 2020.
ROCHA, F.B. DALESE, P. A proteção de dados pessoais como um direito fundamental. Jota, Disponível em: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/a-protecao-de-dados-pessoais-como-um-direito-fundamental-02092020. Acesso em: 18 mai. 2021.
RODRIGUES, M.B.; BENTES, D.S. Conflito entre o sigilo e o acesso à informação: o caso dos prontuários médicos na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Vertentes do Direito, Palmas, v. 6, p. 108-128, 2019.
XAVIER, F. at al. Análise de redes sociais como estratégia de apoio à vigilância em saúde durante a COVID-19. Estudos Avançados, v. 34, p. 261-281, 2020.
A submissão de originais para este periódico implica na transferência, pelos autores, dos direitos de publicação impressa e digital. Os direitos autorais para os artigos publicados são do autor, com direitos do periódico sobre a primeira publicação. Os autores somente poderão utilizar os mesmos resultados em outras publicações indicando claramente este periódico como o meio da publicação original. Em virtude de sermos um periódico de acesso aberto, permite-se o uso gratuito dos artigos em aplicações educacionais, científicas, não comerciais, desde que citada a fonte (por favor, veja a Licença Creative Commons no rodapé desta página).