REGULAÇÃO DE SISTEMAS DE RECONHECIMENTO FACIAL PARA FINS DE SEGURANÇA PÚBLICA NO BRASIL: RISCOS E DESAFIOS
Resumo
O objetivo deste artigo é explicitar os potenciais riscos que o uso incondicionado de sistemas de reconhecimento facial na segurança pública gera a direitos fundamentais. Questiona-se sobre a necessidade de adoção de mecanismos de governança mediante regulação, assim como de contribuições ao contexto nacional proporcionadas pela discussão normativa no exterior. Trata-se de pesquisa pautada em revisão bibliográfica e fontes documentais primárias e secundárias. Diante do escasso material quantitativo sobre a eficácia do uso desses sistemas no Brasil, conclui-se que sua regulamentação é necessária, sendo imprescindível precedê-la por amplo diálogo com a comunidade acadêmica. Ademais, a Proposta de Lei apresentada pela Comissão Europeia ao Parlamento Europeu equilibra, satisfatoriamente, inovação tecnológica e respeito aos direitos fundamentais, sendo que pode se tornar uma referência para o debate nacional. A regulação de inteligência artificial ainda é experimental. Dessarte, este artigo é relevante ao proporcionar uma base para o aprofundamento do tema em estudos futuros.
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